Essa é uma narração que eu fiz para o cursinho sobre a exploração dos cortadores de cana pelos Usineiros.
Os Dispensáveis
O cortador de cana sentiu uma forte pontada no peito. A mão afrouxou, soltando o facão no chão de terra. Ele deu dois passos em falso e caiu no chão, morto.
José Sebastião, seu colega de profissão e companheiro de longa data, parou o que fazia. Colocou a mão na testa suada do amigo, depois checou sua respiração. Assim que constatou a morte, voltou a trabalhar até o Sol de 40 graus centigrados se pôr no horizonte.
Quando chegou em casa, duas horas depois do usual, sua mulher quis saber o motivo do atraso. Ele contou do colega que morrera de exaustão, e que fora avisar a viúva que seu esposo, pai de seis filhos, estava morto; e que o Usineiro se recusara a pagar “indenização”. Pagaria só o que devia ao defunto, deduzido o dia de hoje, afinal ele só trabalhou meio-período.
Naquela noite, José Sebastião não dormiu. Primeiramente ficou pensando na família do colega, como iriam sobreviver? Outro pensamento invadiu sua mente: O mesmo poderia acontecer com ele. E então? Quem sustentaria seus quatro filhos?
Foi com este pensamento que pegou o ônibus rural na manhã seguinte. E foi isso que contou aos colegas na hora do almoço. Desde então, todo dia incentivava os colegas a se revoltarem. “Que vida é esta que levamos?”, “ Temos direitos também!” eram frases comuns em seus discursos.
Então convenceu-os a organizar uma greve. No dia seguinte acertariam os detalhes. Finalmente conseguiriam melhores condições de vida.
Acontece que, de boca em boca, a notícia se espalhou até chegar aos ouvidos do Usineiro. No dia seguinte, assim que chegou a fazenda, José Sebastião foi chamado ao escritório do Usineiro.
Quando entrou na sala resfriada pelo ar-condicionado, viu que o Usineiro, gordo e de terno, o esperava por detrás do notebook.
Após as apresentações o Usineiro já foi dizendo:
- Então senhor José Sebastião, chegou ao meu conhecimento que planeja uma greve.
Ele não deixou José responder.
- Pois bem. A única coisa que vai conseguir é perder o emprego. O seu e o de seus amigos. Sabia que para cada um de vocês empregado, há mais de dez procurando emprego? Basta que eu estrale os dedos para ter novos cortadores, que aceitarão jornadas ainda mais longas. É então que lhe pergunto: Como vai sustentar sua família sem emprego?
Após a conversa, José Sebastião voltou ao trabalho calado. Os colegas estranharam, e acabaram por desistir da greve. José nunca mais falou a palavra “greve”, aliás.
Sete colheitas depois, foi a sua vez de cair no chão da plantação, morto pelo cansaço.